Intermídia


Um dos capítulos mais relevantes do livro Arte e Mídia, de Arlindo Machado, é titulado Convergência e divergência das artes e dos meios (p. 57). Nele, o teórico discute, mediante diagramas de círculos tangentes, a intersecção de mídias, em especial fotografia, cinema e música. Os desenhos servem para demonstrar a inconstância da especificidade midiática, ou seja, a autonomia absoluta de uma mídia com relação às demais. O diagrama de Machado remete, por certo, ao diagrama da intermídia, do grupo Fluxus, com a diferença da inclusão de gradientes centrais, denotando o núcleo duro do meio, ou sua parcela “pura”, avessa a hibridismos. Um exemplo de intermídia manifesta-se no filme L'Enfer, de Henri-Georges Clouzot, diretor francês que, nessa obra, desenvolveu uma bateria de técnicas cinemáticas para ilustrar o monólogo interno de um homem à beira de um ataque de ciúmes. Buscando uma nova “representação plástica”, Clouzot comissionou o artista cinético Vasarely para remontar algumas de suas "esculturas" no estúdio de filmagem.

Diagrama de Arlindo Machado

De qualquer modo, os diagramas de Arlindo e Fluxus ativam outras noções de mídias, como novas mídias (new media) e pós-mídia. Quando falamos em “novas mídias” devemos lembrar a relatividade da locução “novo”, porque o que é novo para nós, contemporâneos, foi novo, de outra forma, para nossos antepassados. A videoinstalação, outrora considerada uma “nova mídia” era, por sua fez, dependente do filme, suporte tradicional sobre o qual camadas de grãos de cristais de prata agem como detectores de fótons. A videoinstalação seria “nova”, portanto, não do ponto de vista historicista (ou seja, do ponto de vista do presente), tendo em conta a diferença entre imagens técnicas, digitalizadas com técnicas de reprodução, e imagens temporais, capturadas e editadas com mídias analógicas. (Na tecnologia analógica, uma onda é registrada ou usada em sua forma original; na tecnologia digital, as informações da onda analógica são representadas por números, que são então armazenados em um dispositivo digital).

Diagrama do grupo Fluxus

Quando falamos em pós-mídia, lembramos da abordagem da teórica estadunidense Rosalind Krauss, para quem o meio, como suporte, é substituído por “suporte técnico”: 
Se os meios (suportes) tradicionais, como pintura e escultura, mobilizam talentos artesanais, o técnico traduz o artesanal nos métodos contemporâneos e tecnológicos; e suporte generaliza as tradições específicas em uma recém-inventada, que agora é genérica, ao invés de específica.

A crítica cita três artistas emblemáticos para ilustrar sua tese: Ed Ruscha, William Kentridge e Harun Farocki. O crítico estadunidense Jack Burnham também oferece a sua versão de pós-mídia, chamada por ele de pós-formalismo, uma variante do pós-suporte, mas com ênfase no sistema que envolve uma determinada manifestação artística:
A abordagem dos sistemas vai além de uma preocupação com os ambientes e acontecimentos; lida de forma revolucionária com a questão das bordas. Na perspectiva dos sistemas não há limites ou fronteiras. Como o proscênio do teatro ou a moldura de um quadro. Assim qualquer situação, dentro ou fora do contexto da expressão artística, pode ser concebida e julgada como sistema. Na avaliação da teoria dos sistemas, o artista é um projetista que considera metas, estruturas, entradas, saídas e atividades relacionadas, dentro e fora do sistema em questão. Se o objeto tem quase sempre uma forma fixa e limites, a consistência de um sistema pode ser alterada no tempo e no espaço, e seu comportamento determinado tanto por condições externas como internas.  

Já para o teórico alemão Peter Weibel, o exemplo de pós-mídia por excelência é a mídia técnica do computador, considerado também uma metamídia, ou seja, um meio capaz de simular todas as mídias anteriores. Para ele, os sistemas informáticos colocam-nos em uma "condição pós-midiática".

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